O QUE HÁ EM MIM É SOBRETUDO CANSAÇO- Fernando Pessoa
O QUE HÁ EM MIM É SOBRETUDO CANSAÇO
Fernando Pessoa
Não disto nem
daquilo,
Nem sequer de tudo
ou de nada:
Cansaço assim
mesmo, ele mesmo,
Cansaço.
A subtileza das
sensações inúteis,
As paixões
violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos
por o suposto em alguém,
Essas coisas todas
Essas e o que falta
nelas eternamente;
Tudo isso faz um
cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.
Há sem dúvida quem
ame o infinito,
Há sem dúvida quem
deseje o impossível,
Há sem dúvida quem
não queira nada
Três tipos de
idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo
infinitamente o finito,
Porque eu desejo
impossivelmente o possível,
Porque quero tudo,
ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder
ser...
E o resultado?
Para eles a vida
vivida ou sonhada,
Para eles o sonho
sonhado ou vivido,
Para eles a média
entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um
grande, um profundo,
E, ah com que
felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo
cansaço,
Íssimo, íssimo,
íssimo,
Cansaço...
Poesias de Álvaro
de Campos.
Fernando Pessoa.
Lisboa: Ática, 1944
(imp. 1993).
Ilustração: Gratuito para
alteração, compartilhamento e uso/Google
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